No livro são contadas as
aventuras e desventuras de uma bela
escrava mestiça em busca de sua
liberdade.
Na primeira parte, Isaura está na
fazenda em
Campos dos
Goytacazes, no
Rio de Janeiro,
vivendo sua vida de escrava bem prendada, da noiva do filho de seus donos
originais. Porém, ela é importunada a todo o momento por alguém querendo
cortejá-la, inclusive o seu sinhô novo, Leôncio. Por ter essa
paixão por Isaura, Leôncio não a liberta,
como sua
mãe havia pedido antes de
morrer.
Mesmo assim, o pai de Isaura,
Miguel, conversa com o pai de Leôncio e faz um trato no qual ele dará 10
contos de réis pela liberdade de sua filha.
Ao chegar com a quantia na casa onde Isaura é escrava, eis que chega uma carta
dizendo que o
pai de Leôncio morreu, dando uma desculpa
para Leôncio não libertar sua escrava. Sem restar outra escapatória para
Isaura, Miguel usa os 10 contos de réis que tinha para comprar sua
alforria em uma fuga. Levando o romance ao
seu segundo estágio. Os intentos de Miguel são de chegar a outro
país, mas enquanto procura pela melhor
oportunidade de sair do
Brasil eles vão para a
cidade de
Recife. Lá eles assumem nomes diferentes e
ficam recolhidos em sua casa.
Quando chegam novamente na
fazenda e Leôncio prende Isaura em total
isolamento, inicia-se a terceira fase da narrativa. Agora seu
algoz
inventa um plano
maquiavélico
para continuar a ter a sua escrava favorita por perto sem deixar sua mulher,
Malvina,
enciumada:
ele coloca como condição para a liberdade de Isaura seu casamento com o
jardineiro da fazenda, Belchior.
Isaura, a heroína escrava, é
branca, linda, pura, virginal e possui um caráter nobre e demonstra
"conhecer o seu lugar": do princípio ao fim, suporta conformada a
perseguição de Leôncio, as propostas de Henrique, as desconfianças de Malvina,
sem jamais se revoltar. Permanece emocionalmente escrava, mesmo tendo sido
educada como uma dama da sociedade. Tem escrúpulos de passar por branca livre,
acha-se indigna do amor de Álvaro e termina como a própria imagem da
"virtude recompensada".
Leôncio é o vilão leviano,
devasso e insensível que, de "criança incorrigível e insubordinada" á
adolescente que sangra a carteira do pai com suas aventuras, acaba por
tornar-se um homem cruel e inescrupuloso, casando-se com Malvina, linda,
ingênua e rica, por ser "um meio mais suave e natural de adquirir
fortuna". Persegue Isaura e se recusa a cumprir a vontade de sua mãe, já
falecida, que queria dar a ela a liberdade e alguma renda para viver com
dignidade.
Tomásia é a condessa de Campos,
rica e bonita, uma das maiores inimigas de Leôncio, devido as maldades que este
praticou contra ela. Antes de se tornar condessa ela era uma camponesa simples,
mas depois de rica, se torna uma mulher poderosa que faz de tudo para se vingar
de Leôncio.
Álvaro é um rico herdeiro,
cavalheiro nobre e de caráter impecável, que "tinha ódio a todos os
privilégios e distinções sociais, e é escusado dizer que era
liberal, republicano e quase
socialista"; um jovem de idéias igualitárias, idealista e corajoso para
lutar contra os valores da sociedade a que pertence. Sua conduta moral é assim
descrita pelo autor: "Original e excêntrico como um rico lorde inglês,
professava em seus costumes a pureza e severidade de um quacker. Todavia, como homem
de imaginação viva e coração impressionaável, não deixava de amar os prazeres,
o luxo, a elegância, e sobretudo as mulheres, mas com certo platonismo
delicado, certa pureza ideal, próprios das almas elevadas e dos corações bem
formados."
Numa literatura não muito
abundante em manifestação abolicionistas, é obra de muita importância, pelo
modo sentimental como focalizou o problema, atingindo principalmente o público
feminino, que encontrava na literatura de ficção derivativo e caminho de fuga,
numa sociedade em que a mulher só saía à rua acompanhada e em dias
pré-estabelecidos; o mais do tempo ficava retida em casa, sem trabalho
obrigatório, bordando, cosendo, ouvindo e falando mexericos, isto é, enredos e
intrigas, como se dizia no tempo e ainda se diz neste romance.
Bernardo Guimarães faz questão de
ressaltar exaustivamente a beleza branca e pura de Isaura, que não denunciava a
sua condição de escrava porque não portava nenhum traço africano, era educada e
nada havia nela que "denunciasse a abjeção do escravo". O que parece
uma escolha preconceituosa e contraditória – contar as agruras da escravidão
criando uma escrava branca – talvez seja melhor compreeendido se levar em conta
que a maior parte do público que consumia romances na época era composto por
mulheres da sociedade, que apreciavam as histórias de amor.
Somem-se a isso o modelo de
beleza feminino de então, caracterizado pela pele nívea e maçãs rosadas do
rosto e, principalmente, o objetivo do autor de conquistar a solidariedade do
leitor pela escrava, mostrando a que ponto extremo poderia chegar o regime
escravocrata: "fisicamente, Isaura não é diferente das damas da sociedade,
mas, por ser escrava, é obrigada a viver como os de sua classe, como objeto
útil nas mãos de seu senhor", conforme afirma a crítica Maria Nazareth
Soares Fonseca.
O autor claramente conseguiu o
que queria. A sociedade brasileira do
século XIX, que tanto se apiedou das
desventuras de Isaura, aceitou-a porque ela era branca e educada. O autor pôde,
assim, demonstrar, através do seu sofrimento, o quanto "é vã e ridícula
toda a distinção que provém do nascimento e da riqueza". E é claro, a cor
de Isaura serve, como afirma o crítico Antônio Cândido, "para facilitar a
ação de Álvaro, compreensivelmente apaixonado e decidido a desposá-la, como
ENREDO
A história se passa nos
“primeiros anos do reinado de D. Pedro II”, inicialmente em uma fazenda em
Campos dos Goitacazes (RJ). Isaura, escrava branca e bem-educada, é assediada
pelo seu senhor, Leôncio, recém-casado com Malvina. Isaura se recusa a ceder
aos apelos de Leôncio, como já fizera, no passado, sua mãe, que, por ter
repelido o pai de Leôncio, fora submetida a um tratamento tão cruel que, em
pouco tempo, morrera.
Para forçá-la a ceder, Leôncio manda Isaura
para a senzala, trabalhar com as outras escravas. Sempre resignada, suporta
passivamente o seu destino, porém, não cede a Leôncio, afirmando que ele, como
proprietário, era senhor de seu corpo, mas não de seu coração: “ - Não, por
certo, meu senhor; o coração é livre; ninguém pode escravizá-lo, nem o próprio
dono.” Leôncio, enfurecido, ameaça colocá-la no tronco.
No entanto, seu pai, ex-feitor
da fazendo, consegue tirá-la de lá e foge com ela para Recife (PE). Em Recife,
Isaura usa o nome de Elvira e vive reclusa numa pequena casa com seu pai.
Então, conhece Álvaro, por quem se apaixona e é correspondida. Vai a um baile
com ele, onde é desmascarada e reconhecida. Álvaro, ainda que surpreso, não se
importa com o fato de ela ser uma escrava e resolve impedir que Leôncio a leve
de volta, inclusive tentando comprá-la. Mas não consegue convencer o vilão, e
este leva Isaura de volta ao cativeiro na fazenda.
Leôncio está praticamente falido e, com o
objetivo de conseguir um empréstimo do pai de Malvina, consegue se reconciliar
com a mulher, afirmando que Isaura é quem o assediava. Então, para punir
Isaura, Leôncio manda que ela se case com Belchior, jardineiro da fazenda.
Entretanto, Álvaro descobre a falência de Leôncio e compra a dívida dos seus
credores, tornando-se proprietário de todos os seus bens, inclusive de seus
escravos. No dia do casamento de Isaura, antes que se celebrasse a cerimônia,
Álvaro aparece e reclama seus direitos a Leôncio. Vendo-se derrotado e na
miséria, Leôncio suicida-se. Tudo termina, portanto, com a punição dos culpados
e o triunfo dos justos.
Como
bem o sintetizou Carlos Alberto Vecchi:
“A
estrutura narrativa de A Escrava Isaura segue o modelo folhetinesco das
histórias românticas: para atingir seu ideal e obter o reconhecimento de todos,
o herói tem que realizar uma jornada perigosa, onde a própria vida é colocada
em risco. O Amor, epicentro onde se debatem o Bem e o Mal, torna-se a força
motriz que conduz ao restabelecimento do equilíbrio e da felicidade a todos
que, em momento algum, se deixaram intimidar pelos desmandos de Leôncio. O Mal
extirpado (o suicídio de Leôncio) cede lugar ao Bem. E aqueles que nortearam
suas ações pelas virtudes maiores é que estão aptos a receber o prêmio daí
decorrente.”
Escrito em plena campanha
abolicionista (1875),
o livro conta as desventuras de Isaura, escrava branca e educada, de caráter
nobre, vítima de um senhor devasso.
O romance foi um
grande sucesso editorial e permitiu que Bernardo Guimarães se tornasse um dos mais populares romancistas de sua época. O autor pretende, nesta
obra, fazer um libelo antiescravagista e libertário e, talvez, por isso, o
romance exceda em idealização romântica, a fim de conquistar a imaginação
popular perante as situações intoleráveis do cativeiro. O estudioso Manuel
Cavalcanti Proença observa
que:
Numa literatura não
muito abundante em manifestação abolicionistas, é obra de muita importância,
pelo modo sentimental como focalizou o problema, atingindo principalmente o
público feminino, que encontrava na literatura de ficção derivativo e caminho
de fuga, numa sociedade em que a mulher só saía à rua acompanhada e em dias
pré-estabelecidos; o mais do tempo ficava retida em casa, sem trabalho
obrigatório, bordando, cosendo, ouvindo e falando mexericos, isto é, enredos e
intrigas, como se dizia no tempo e ainda se diz neste romance.
Este romance já foi
considerado, com bastante exagero, uma espécie de A Cabana do Pai
Tomás (1851)
brasileiro. Porém, Bernardo Guimarães, ao contrário da romancista americana Harriet Beecher
Stowe, detém-se muito pouco na descrição dos sofrimentos provocados
pelo regime escravagista. Ele coloca, na boca de alguns personagens, como
Álvaro e seus amigos, estudantes no Recife, algumas frases abolicionistas, mas
parece tomar bastante cuidado em não provocar a fúria dos seus leitores
conservadores. Está mais preocupado em contar as perseguições do senhor cruel à
escrava virtuosa e, assim, conquistar a simpatia do leitor.
Bernardo Guimarães
faz questão de ressaltar exaustivamente a beleza branca e pura de Isaura, que
não denunciava a sua condição de escrava porque não portava nenhum traço
africano, era educada e nada havia nela que "denunciasse a abjeção do
escravo". O que parece uma escolha preconceituosa e contraditória — contar
as agruras da escravidão criando uma escrava branca — talvez seja melhor compreeendido
se levar em conta que a maior parte do público que consumia romances na época
era composto por mulheres da sociedade, que apreciavam as histórias de amor.
Somem-se a isso o
modelo de beleza feminino de então, caracterizado pela pele nívea e maçãs
rosadas do rosto e, principalmente, o objetivo do autor de conquistar a
solidariedade do leitor pela escrava, mostrando a que ponto extremo poderia
chegar o regime escravocrata: "fisicamente, Isaura não é diferente das
damas da sociedade, mas, por ser escrava, é obrigada a viver como os de sua
classe, como objeto útil nas mãos de seu senhor", conforme afirma a
crítica Maria Nazareth Soares Fonseca.
O autor claramente
conseguiu o que queria. A sociedade brasileira do século XIX, que tanto se apiedou das
desventuras de Isaura, aceitou-a porque ela era branca e educada. O autor pôde,
assim, demonstrar, através do seu sofrimento, o quanto "é vã e ridícula
toda a distinção que provém do nascimento e da riqueza". E é claro, a cor
de Isaura serve, como afirma o crítico Antônio Cândido, "para facilitar a
ação de Álvaro, compreensivelmente apaixonado e decidido a desposá-la, como
fez."
Se houve influência,
portanto, do romance A cabana
do Pai Tomás, talvez tenha sido apenas no que o crítico Alfredo Bosi aponta
como referência: a cena da fuga de Campos para Recife, "talvez sugerida
pela fuga de Elisa através dos gelos flutuantes de Ohio para a liberdade no
Norte e por fim no Canadá". Entretanto, o fato é que, como aponta o
crítico, só depois do lançamento de A cabana do Pai Tomás "a literatura
brasileira começou a ser povoada de feitores cruéis e de escravos
virtuosos".